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Reunião do BRICS em Chongqing: foco no fortalecimento da cooperação entre os países do grupo

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No final de setembro, durante a reunião de track II do BRICS em Chongqing, no sudoeste da China, cerca de 40 analistas brasileiros, indianos, chineses e sul-africanos debateram o futuro do agrupamento. Os anfitriões chineses haviam escolhido “Ajuste, Inovação e Cooperação” como o subtítulo do fórum, e isso serviu para direcionar a conferência por dois dias.

Uma das questões chave do debate foi como criar ajustes ao difícil cenário econômico global, considerando que a recuperação não é estável nos Estados Unidos, e virtualmente inexistente na Europa. Os BRICS já estão consultando e parcialmente coordenando suas posições no FMI e no G20, e em muitos casos, os seus membros conseguem adotar posições comuns. Por exemplo, quando os países do BRICS juntos concordaram em contribuir mais de 70 bilhões de dólares ao FMI durante a reunião do G20 em Los Cabos (México), eles concordaram com a necessidade de urgentemente implementar as reformas de cotas negociadas para que fosse restaurada a legitimidade do FMI. Juntamente, também rejeitaram o apelo por mais taxas sobre os seus sistemas bancários, enfatizando que os seus bancos não estavam na origem da crise financeira e, portanto, não deveriam ser punidos.

Sem a severa crise econômica na Europa e nos Estados Unidos desde 2008, é claro, a marca BRICS e as potências emergentes de maneira geral nunca teriam recebido a atenção global que receberam ao longo dos últimos anos. A capacidade dos BRICS de manter suas trajetórias de crescimento alterou profundamente a maneira como pensamos sobre a distribuição global de poder econômico. Embora alguns líderes do Sul Global expressem alegria com relação à crise financeira no Ocidente, o debate em Chongqing refletiu o claro entendimento de que uma rápida recuperação na Europa e nos Estados Unidos é essencial para os BRICS, o que explica sua decisão pragmática de aumentar maciçamente as suas contribuições ao FMI.

Por ‘inovação’, os participantes da conferência entendiam, de maneira geral, a ‘inovação institucional’. O Banco de Desenvolvimento do BRICS foi recebido com grande entusiasmo. O que foi notável foi o quanto a ideia amadureceu desde a 4ª Cúpula do BRICS em Nova Déli, durante a qual as apresentações de analistas sobre o Banco foram de natureza bastante genérica. O representante sul-africano que falou sobre a possibilidade da existência de um banco como esse ofereceu uma das perspectivas mais detalhadas, oferecendo uma série de considerações técnicas que mostram quanto trabalho já foi empreendido desde que o conceito emergiu pela primeira vez. Foi interessante notar que a delegação chinesa foi a que se mostrou mais hesitante, em contraste com a euforia dos russos e dos indianos.
Mas apesar do número crescente de analistas que apoiam a ideia de um Banco de Desenvolvimento do BRICS, muito depende do relatório de viabilidade atualmente elaborado pela força tarefa composta por representantes dos Ministérios da Fazenda de cada país membro do BRICS. Esse relatório será apresentado no encontro track I do BRICS em Durban (África do Sul), em março de 2013.

Por fim, encontrar maneiras de aumentar a cooperação entre os países do BRICS (o chamado ‘crescimento para dentro’, como formulou o Embaixador Gelson Fonseca), continua a ser uma das prioridades da agenda do grupo, tratando-se de uma das questões menos controversas. As reuniões notavelmente frequentes entre os ministros e entre os tecnocratas do BRICS ao longo dos últimos anos levaram a uma variedade de iniciativas, inclusive no setor privado, nos think tanks e na sociedade civil, o que contribui para o fortalecimento dos laços.
A decisão do governo chinês de realizar o evento em Chongqing (invés de Beijing, como era esperado) provavelmente foi para mostrar aos participantes internacionais que o progresso econômico chegou há muito tempo ao interior do país, o que talvez tenha oferecido uma perspectiva diferente da China aos visitantes.

Comparado com as reuniões anteriores, é notável o quão técnicas e específicas se tornaram as conversas entre os países do BRICS, o que representa um forte contraste com as declarações vagas sobre uma ‘nova ordem global’ feitas com frequência durante os primeiros anos do grupo. Decisões tais como consultas institucionalizadas antes das cúpulas do G20 sobre a criação do Banco de Desenvolvimento do BRICS são, é claro, altamente políticas, porém, cada vez mais, são o resultado da cooperação entre tecnocratas por trás dos bastidores, mais de que de grandes declarações de líderes.

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SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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