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O novo protagonista africano

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Poucos países enfrentam tantos desafios internos como a Nigéria. Nos últimos quatro anos, os militantes islâmicos do Boko Haram têm desencadeado vários ataques violentos no norte e no centro do país, matando milhares de pessoas. O exército nigeriano está fortemente envolvido na região e o governo dos Estados Unidos recentemente categorizou o grupo Boko Haram como uma organização terrorista. A Nigéria tem o maior número de tentativas de sequestro no mundo, responsável por um quarto de todos os incidentes registrados globalmente. Lagos, a maior cidade do país, é a capital mundial de fraudes na internet, somando-se ao fato do país ter um dos maiores índices de mortes no trânsito.

No entanto, parece provável que a Nigéria irá ultrapassar a África do Sul em 2014 ou 2015, transformando-se na maior economia da África. Ao longo da última década, o país cresceu 7% ao ano, com um crescimento esperado em 2013 de pelo menos 6,8% – muito maior do que os meros 2,5% da África do Sul. Além disso, a moeda da Nigéria é relativamente estável e a inflação teve uma nova baixa no mês passado. Apesar dos problemas com roubo e corrupção no setor petrolífero, a Nigéria cresceu tão rápido este ano devido a um forte desempenho nos setores de telecomunicações, agricultura, hotelaria e construção. A proporção da dívida da Nigéria em relação ao seu PIB é muito baixa, particularmente se comparada com muitos países ricos. Isto é também atribuído à respeitada ministra das Finanças da Nigéria, Ngozi Okonjo- Iweala, cuja candidatura à diretora do Banco Mundial em 2012 recebeu amplo apoio dos países emergentes.

Esta mudança de liderança na África é meramente simbólica, mas está em consonância com uma importante tendência mundial: a economia global será cada vez mais dominada por países pobres com grandes populações. O PIB per capita da Nigéria é de 1.500 dólares, cinco vezes menor que o da África do Sul. No entanto, com mais de 160 milhões de habitantes, a Nigéria é três vezes mais populosa.

O crescimento contínuo na Nigéria enfraquece as ambições de liderança regional da África do Sul. A tentativa de conquistar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU torna-se cada vez mais irreal para Pretória. As potências econômicas da África do século XXI são, dentre outras, Nigéria, Etiópia, Egito e Angola.

Apesar disso, a África do Sul continuará a desempenhar um papel crucial tanto em assuntos regionais quanto globais. A liderança diplomática da África do Sul ao longo das últimas duas décadas em múltiplos fóruns – IBAS, BRICS, ONU, e a União Africana – e sua reputação positiva em relação à transição pacífica do apartheid para a democracia não pode ser igualada a de qualquer outro país africano. Não foi por acaso que os líderes dos BRICS decidiram convidar a África do Sul, e não a Nigéria, para se juntar ao grupo.

Ao longo prazo, porém, aqueles que procuram reforçar a sua presença diplomática e econômica no continente africano – como o Brasil – precisam olhar cada vez mais para a Nigéria.

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Foto: Charles Oropallo

SOBRE

Oliver Stuenkel

Oliver Della Costa Stuenkel é analista político, autor, palestrante e professor na Escola de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em São Paulo. Ele também é pesquisador no Carnegie Endowment em Washington DC e no Instituto de Política Pública Global (GPPi) ​​em Berlim, e colunista do Estadão e da revista Americas Quarterly. Sua pesquisa concentra-se na geopolítica, nas potências emergentes, na política latino-americana e no papel do Brasil no mundo. Ele é o autor de vários livros sobre política internacional, como The BRICS and the Future of Global Order (Lexington) e Post-Western World: How emerging powers are remaking world order (Polity). Ele atualmente escreve um livro sobre a competição tecnológica entre a China e os Estados Unidos.

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